EDITORIAL


Quando eu me poupe a falar,
Aperta-me a garganta e obriga-me a gritar!
José Régio


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20160919

"Viriato, Nosso Avô"


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O I Capítulo de "Príncipes de Portugal, Suas Grandezas e Misérias", de Aquilino Ribeiro, tem como título - "Viriato, Nosso Avô" e o autor começa por explicar porque razão, os romanos "taxaram" Viriato de dux latronum, capitão de salteadores, e não faltavam totalmente à verdade porque os rudes pastores lusitanos, habitantes dos montes, quando passavam maiores dificuldades, era sem rebuço que roubavam os vizinhos, mais afortunados das planuras. E justifica porque razão "viriato", passou de posto militar (chefe) a nome próprio - "Viriato":
“O homem desenganado e resoluto que a tribo julgou digno das vírias, chamasse-se como se chamasse, a partir  da  imposição  não  teve  outro nome: viriato. Viriato quer dizer, portanto, investido com as vírias, como um monarca pela graça de Deus. Decerto era a mais alta dignidade conferida por aquele povo, pastores honrados na tribo e piratas temíveis na terra alheia. Vírias eram grandes argolas de  metal, tantas vezes de oiro, com que guarneciam o braço que segurava a espada ou que ornavam as pernas dos cavaleiros. Divisas do comando, com significação gradual talvez, representavam simultaneamente o emblema de um posto, um enfeite e ainda um amparo contra a lança  e  a  espada.”
Naturalmente depois de contados pormenores da epopeia da resistência de Viriato e dos lusitanos, aos romanos invasores, o capítulo encerra com a descrição da traição e morte de Viriato:
(...)"Os três regressaram ao arraial lusitano quando tudo dormia. Na própria tenda o capitão dormia estirado por terra em cima de uma pele. Uma cutilada à mão-tente, e não foi preciso mais.
Quando, sobre a alba, os soldados fiéis encontraram o cadáver, compreenderam toda a obra de insídia e traição. Só havia que celebrar as exéquias. Armaram um pira gigantesca de lenha e, içando o corpo ao alto, incineraram.no. Em torno os guerreiros da tribo dançaram, jogaram as armas, imolaram cativos. Era a forma de o honrar e impedir que os gusanos da terra, tão bem como o inimigo, se gozassem do seu cadáver, rooendo-o uns, conspurcando-o outros como passear.lhe a cabeça, cravada num chuço, diante das populações pasmadas.
Assim acabou o herói, não tardando que a Lusitânia o seguisse no passo fatal, riscada do número dos povos livres, crescendo à rédea solta de sua índole natureza."

Aquilino Ribeiro, tal como Vasco Graça Moura explica no Prefácio. não escreveu uma obra com "pretensões científicas" mas usou o seu grande talento de prosador e os conhecimentos adquiridos em inúmeras leituras de antigos calhamaços, crónicas, biografias e diversas versões da "História de Portugal", para criar a sua visão pessoal, muitas vezes bem humorada, irónica e desmistificadora dos biografados que vão de Viriato a D. José I e o Grande Marquês. passando por D. Afonso Henriques, Rainha Santa Isabel, D. Pedro I, D. João o Mestre de Avis e o Condestável, Leonor de Portugal, D. João III, D. Sebastião e D. António I.
"Príncipes de Portugal, Suas Grandezas e Misérias", de Aquilino Ribeiro, Prefácio de Vasco Graça Moura, Ilustrações de Costa Pinheiro, Portugália Editora, Lisboa 2008.
Mestre Aquilino Ribeiro foi um democrata, anti-salazarista e a sua despretensiosa obra, resultante de uma encomenda, escrita depois de cuidada investigação, de imediato desagradou ao regime e à Universidade, tendo o assunto sido discutido na Assembleia Nacional. O escândalo deu origem a uma manifestação de desagravo em Coimbra e a Censura, informou o editor que "não consideravam oportuna, no momento presente a reedição do livro". De facto o livro não chegou a ser proibido mas o caso aconselhava prudência.

Ilustrações: O Viriato (Mariano Benlliure/1940) decorado para a feira anual de Viseu